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Baixe esse texto em pdf: Educar ou Condicionar

Uma das questões que mais preocupam os pais na educação de seus filhos é saber como e quando interferir positivamente no  comportamento deles e obter resultados satisfatórios para ambas as partes. Muitas ações são frequentemente usadas pelos pais e educadores para ter um retorno aceitável de suas crianças, como :

– Conceder etiquetas com carinhas sorrindo a cada bom comportamento ou tarefa cumprida;
– Aplicar carinhas tristes a cada birra ou descumprimento de tratos;
– Deixar chorar por intervalos de tempos crescentes até que a criança aprenda a dormir sozinha;
– Usar quadros de recompensa para estimular o desfralde.

Esses métodos funcionam?
Claro que funcionam!

A resposta, de que sim, funcionam, dá aos pais uma sensação de alívio, um sentimento de finalmente terem descoberto um método eficaz para lidar com os desafiadores “maus” comportamentos!  A partir do uso desses métodos, no curto prazo, a criança começa a apresentar comportamentos mais gentis, colaborativos, passa a dormir a noite toda, começa a segurar mais o xixi. A questão é que, embora a resposta seja verdadeira, ela não está completa e a pergunta adequada não seria se os métodos funcionam. As perguntas que podem gerar um pouco mais de ansiedade nos pais, mas que são fundamentais de serem consideradas, são:

Quais as consequências, no longo prazo, do uso de tais métodos?
Qual é o custo emocional desse tipo de treino?

Ao pensarmos nas melhores formas de educar nossos filhos, principalmente em momentos desafiadores, aqueles em que nos sentimos frustrados, irritados, nervosos, ou até mesmo desesperançosos, devemos levar em conta não apenas o curto, mas também o longo prazo.

Reflitamos, por alguns instantes: que virtudes gostaríamos de ver em nosso filho adulto? Essas virtudes precisam ser cultivadas e cada etapa do desenvolvimento infantil nos brinda com a oportunidade de ajudar nossos filhos a desenvolvê-las. Os conflitos, as crises de cada etapa, são os momentos mais cruciais para isso.

O desafio, por parte dos pais, está em equilibrar a necessidade premente de cessar o problema imediatamente (crises de choro, ataques de birra, desobediências) com o objetivo maior de desenvolver aquelas virtudes em que pensamos alguns minutos atrás. Cultivá-las vai exigir de nós, pais ou cuidadores, dedicação em um processo longo, árduo em alguns momentos, que envolverá sabermos entrar em um estado de curiosidade, compaixão e calma – características que possibilitam a verdadeira conexão com os nossos filhos.

O método do reforço positivo/punição, que embasa os quadros de incentivo, funciona, mas não ajuda no desenvolvimento de habilidades ou comportamentos úteis no longo prazo.

A criança não deveria ser incentivada a cumprir combinados, tratar bem o amiguinho, comportar-se “bem” para ganhar recompensas externas como um selinho verde ou qualquer outra coisa, ainda que simbólica.

A criança precisa entender que há princípios que regem a maneira como lidamos com nós mesmos e com os outros. Não ensinaremos a importância do respeito, por exemplo, se desviarmos sua atenção para as recompensas externas.

A punição (ganhar selinhos vermelhos ou carinhas tristes) pode ter efeitos nocivos, prejudicando o senso de autonomia e iniciativa, gerando culpa e raiva, o que terá repercussão negativa na forma de más adaptações na fase adulta.

Sabemos que rotina é importante,  que um nível tolerável de frustração é benéfico para que a criança desenvolva um sentido de confiança em si mesma.

Tomemos como exemplo a hora de dormir.  Ensinar a criança a dormir sozinha é um processo importante. E os pais devem aprender a lidar com o choro, se houver, de maneira natural. O problema está na aplicação de métodos comportamentais sem levar em conta as especificidades (tanto fisiológicas quanto psicológicas) de cada fase do desenvolvimento infantil.

Nos primeiros 18 meses de vida, métodos rigorosos de treino do sono podem ser muito prejudiciais. O rápido êxito desse tipo de método pode deixar os pais muito crentes e encantados. No entanto, esse encantamento cega os pais para o fato de que a criança adormeceu porque perdeu a esperança de que o cuidador apareceria para confortá-la. O que ela aprendeu nesse processo? Que não pode confiar nas figuras cuidadoras, tão fundamentais para prover um sentido de segurança básica nos primeiros anos de vida.

O uso desses métodos de treino do sono nas demais fases do desenvolvimento da criança ainda pode implicar em outras más adaptações em fases posteriores. Assim, o cuidado deve continuar e os limites e as fragilidades tanto das crianças, quanto dos pais devem ser considerados antes da decisão de aplicar modelos de livros.

Então, como cultivar virtudes de esperança, autoconfiança, autonomia, iniciativa e produtividade em nossos filhos? Nas palavras de Erik Erikson, somente uma combinação parental de verdadeira tolerância e firmeza poderá guiar um processo infantil que resulte em um adulto capaz de desenvolver soluções íntegras e integradas para lidar com os desafios inerentes à vida.

Mudar o comportamento dos filhos implicará em uma mudança de paradigma por parte dos pais. Essa mudança nos levará a compreender que antes de tentarmos mudar o comportamento deles, poderá valer a pena pensarmos em quais crenças e comportamentos teremos que mudar em nós mesmos para estabelecermos uma conexão com nossos filhos fundamentada no respeito e na compaixão. Isso envolve termos em mente que já fomos crianças e que investir tempo em conhecer nossa própria biografia emocional é um dos caminhos para entendermos como nossos padrões de comportamento determinam a relação que estabelecemos com os nossos filhos.

Essa é a premissa da criação de filhos de dentro para fora.

O convite, portanto, é que façamos o exercício de olhar para nós mesmos, numa jornada que envolverá um mergulho em nosso mundo interior, resgatando temas ou assuntos não bem resolvidos, que, embora esquecidos, estão bem guardados, e são constantemente ativados na medida em que interagimos com nossos filhos hoje.

É a proposta de um outro caminho para a educação de filhos. Um caminho de dentro para fora, em contraposição ao caminho mais difundido que promete resultados em pouco tempo através de métodos puramente comportamentais (como reforço e punição), mas que sozinhos, provavelmente não terão o poder de prover os fundamentos para o cultivo das virtudes que desejamos ver florescer nas próximas gerações.

Autor: Flávia Pires Barbosa Lima

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