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Baixe esse texto em pdf: Criando nossos filhos – Lidando com as feras

Criar: dar existência, dar origem, alimentar, sustentar, cultivar, educar, ensinar, instruir.

Como estamos criando nossos filhos? Estamos sendo bons pais? Boas mães? Bons cuidadores? Como sabê-lo?

Como estamos lidando com aqueles momentos em que somos desafiados a mostrar que somos competentes na criação de nossos filhos?

Birras, brigas, choros, indisciplina, desobediência. Essas são situações que nos exigem em nossas melhores habilidades parentais. Situações em que o comportamento inadequado ativa em nós, pais e mães, sentimentos e emoções que nos levam frequentemente a reagir usando estratégias cujo foco está em tirar nós mesmos, e nossos filhos, daquela situação o mais rapidamente possível. Tais estratégias comumente envolvem estabelecer consequências.

E as consequências tendem a aparecer na forma de castigos ou ameaças (se não comer direito não verá televisão; se bater novamente no seu irmão não irá passear; você passará alguns minutos aí sentado, para pensar no que fez; se não parar com isso ficará uma semana sem usar o tablet).

Com isso, consideramos que estamos disciplinando nossos filhos. Disciplinar tornou-se sinônimo de punir e castigar para retificar comportamentos inadequados. No entanto, compreendendo a origem da palavra, disciplinar significa ensinar, e ensinar relaciona-se a transmitir conhecimentos, dar instruções, indicar, explicar, formar e educar. Pouco provavelmente castigos e ameaças terão esse efeito.

Uma reflexão importante é que em geral os pais veem esses momentos difíceis apenas como situações desagradáveis, porém inevitáveis pelas quais temos que passar. Mas também podemos pensar que esses são os melhores e mais críticos momentos para transmitirmos aos nossos filhos ensinamentos fundamentais para que eles se tornem adultos emocionalmente felizes. Ou seja, é exatamente nessas circunstancias, que a principio gostaríamos de evitar, que temos a oportunidade de preparar nossos filhos para serem adultos resilientes e felizes, com recursos para lidarem com situações em que se sentem contrariados ou frustrados na vida adulta. Como estamos aproveitando essas oportunidades?

A disciplina deveria servir a dois propósitos, um de curto prazo (de cessar determinado comportamento) e outro de longo prazo (formar a base para o desenvolvimento de recursos que ajudarão nossos filhos a lidarem com situações difíceis no futuro). Castigos e ameaças atendem o primeiro propósito. Ensinar atende os dois.

Para ensinar é necessário estabelecer um contexto de profunda conexão com a criança. Conectar-se com a criança significa estabelecer uma relação de empatia e respeito. Isso pode parecer óbvio, mas em momentos desafiadores o mais comum é que haja uma total desconexão, o que é bastante compreensível na medida em que os pais se veem cansados, irritados, bravos, entre outros sentimentos que são ativados em tais contextos.

Existe uma confusão entre o conceito de  conexão e o de permissividade. Talvez a linha seja tênue, mas há uma grande diferença entre as duas abordagens.

A conexão envolve conseguir transmitir à criança que o “não” se refere a um determinado comportamento e não a ela. Conectar-se é mostrar para a criança que você entende o que ela está sentindo, é fazer com que ela se sinta ouvida (ainda que ela não consiga se expressar por palavras). É ainda oferecer uma estrutura em que os limites são claros e consistentes (oposto à permissividade). Dar limites ajuda a desenvolver previsibilidade e segurança. Esses dois conceitos, previsibilidade e segurança, são princípios fundamentais na formação da identidade de uma pessoa.

Antes de qualquer ação (ou reação) a um determinado comportamento inadequado, buscar a conexão, via a empatia e o respeito, é necessário para que se crie um ambiente de aprendizado (nosso objetivo de longo prazo) e não um ambiente de punição e ameaça (cujo resíduo estará pautado simplesmente no curto prazo).

Como conseguir, em momentos em que a criança e os pais estão tomados por emoções intensas, estabelecer esse tipo de conexão? Seguramente essa iniciativa pertence aos pais. E não é fácil.

O foco agora está em nós, pais.

Falar alto, usar ameaças, por de castigo, chacoalhar, bater, são comportamentos reativos que nos afastam de qualquer possibilidade de conexão. O termo “reativo” é para dar a conotação de que nos deixamos levar pelo piloto automático, completamente tomados por nossas emoções, deixando de lado (não conscientemente) nossas propriedades de reflexão, intenção, escolha, decisão e julgamento. Nesse momento, entramos num modo de funcionamento similar ao que estão nossos filhos e isso nos leva a uma total incompetência para ensinar alguma coisa.

Na condição de adultos, com recursos mais bem desenvolvidos de autorreflexão, é preciso dedicar tempo para conhecer ou reconhecer o que está acontecendo conosco. Que emoções são ativadas quando lidamos com determinadas situações? Que padrões de comportamento tendemos a assumir quando nossos filhos se comportam de determinada forma? Não ter consciência disso nos leva ao piloto automático. Trazer essas reflexões à consciência nos coloca em uma posição melhor para escolhermos para quê, quando e como queremos agir.

Como fazer isso? Possivelmente com pequenos exercícios ao longo da jornada – a autorreflexão é um exercício mental e vamos nos tornando mais eficazes em fazê-lo na medida em que o praticamos. Ao nos tornarmos conscientes, poderemos domar as feras que estão dentro de nós. Ao fazê-lo, estaremos em condições de aumentar a qualidade do vínculo que estabelecemos com nossos filhos nesses momentos em que eles mais precisam do nosso apoio, compreensão e ensinamento.

Autor: Flávia Pires Barbosa Lima

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